terça-feira, 25 de setembro de 2007

O sol já não brilha aqui


Já gastámos as palavras pela rua (...)
E o que nos ficou não chega
Para afastar o frio de quatro paredes.
Gastámos tudo menos o silêncio.
Gastámos os olhos com o sal das lágrimas,
Gastámos as mãos à força de as apertarmos,
Gastámos o relógio e as pedras das esquinas
Em esperas inúteis.

Meto as mãos nas algibeiras e não encontro nada.
Antigamente tínhamos tanto para dar um ao outro;
Era como se todas as coisas fossem minhas:
Quanto mais te dava mais tinha para te dar.

Às vezes tu dizias: os teus olhos são peixes verdes.
E eu acreditava.
Acreditava,
Porque ao teu lado
Todas as coisas eram possíveis.

Mas isso era no tempo dos segredos,
Era no tempo em que o teu corpo era um aquário,
Era no tempo em que os meus olhos
Eram realmente peixes verdes.
Hoje são apenas os meus olhos.
É pouco, mas é verdade,
Uns olhos como todos os outros
(...)
.
EUGENIO DE ANDRADE (1950)
.
.
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ps: porque sempre gostei deste poeta, e deste poema em especial... porque volta e meia as minhas palavras tropeçam nestas, e re.aparecem no meu discurso... porque parte de mim está contido nele... porque sim, por estes motivos e mais algum que o in*consciente não me faz falar agora

2 comentários:

Anónimo disse...

Esse poema é simplesmente qualquer coisa de ... nem sei explicar. Gosto e como tu, sempre gostei dele.É daqueles que tem tanta sintonia com a nossa mente que só faltava ter saido da coordenação perfeita da nossa caneta... Adoro o teu in*consciente, pois ele mais nao é o reflexo do que mais gosto em ti - a coerência e a profundidade! Bj@nd

Anónimo disse...

Bastante profundo sim senhora! Mas continuo a dizer q e um bocadinho "cinzento e sem cor"! afinal sou a "menina de artes"..=)

Eugenio de Andrade, um poeta sempre opurtuno..tb!

bjinho

p.s- Nao sou doida!!Quem ler aquilo ate pensa outras coisas...